15


























Nie yin niang (Hou Hsiao-Hsien, The Assassin, 2015)




15
Hou Hsiao-Hsien, Nie yin niang (The Assassin)
Larry Clark, The Smell of Us 
Hong Sang-soo, Jigeumeun matgo geuttaeneun tteullida (Right Now, Wrong Then)
Paul Thomas Anderson, Inherent Vice
Miguel Gomes, As Mil e Uma Noites
Levan Gabriadze, Unfriend
Jean-Luc Godard, Adieu au langage
George Miller, Mad Max: Fury Road
Bennett Miller, Foxcatcher
Bertrand Mandico, Notre Dame des Hormones
Peter Strickland, The Duke of Burgundy
David Robert Mitchell, It Follows
Wang Bing, Feng ai ('Til Madness Do Us Part)
Philippe Garrel, L'ombre des femmes 
M. Night Shyamalan, The Visit



































J. G. Biberkopf, Ecologies (Knives, 2015)




+ 15
King Midas Sound, Fennesz, Edition 1 (Ninja Tune)
death's dynamic shroud.wmv, I'll Try Living Like This (Dream Catalogue)
Dawn Richard, Blackheart (Our Dawn Entertainment)
Jeff Bridges, Sleeping Tapes (edição própria)
Rustie, EVENIFUDONTBELIEVE (Warp)
Future, 56 Nights / DS2, (Freebandz)
Romare, Projections (Ninja Tune)
DJ Richard, Grind (Dial)
Oneohtrix Point Never, Garden Of Delete (Warp)
Helm, Olympic Mess (Pan)
Fis, The Blue Quicksand Is Going Now (Loopy)
J. G. Biberkopf, Ecologies (Knives)
Disasterpeace, It Follows OST (Milan)
Kuedo, Assertion of a Surrounding Presence (Knives)
Jamie XX, In Colour (Young Turks)



Como complemento, ver lista do melhor terror de 2015 (aqui).



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O Melhor Terror de 2015




















Unfriended  (Levan Gabriadze, 2014)




15  (-3)

David Robert Mitchell, It Follows
Levan Gabriadze, Unfriend
M. Night Shyamalan, The Visit
Todd Strauss-Schulson, The Final Girls
Eli Roth, The Green Inferno
Jason Lei Howden, Deathgasm
Jemaine Clement, Taika Waititi, What We Do in the Shadows
Grant Harvey, Steven Hoban, Brett Sullivan, A Christmas Horror Story
Corin Hardy, The Hallow
Alex Ross Perry, Queen of Earth
Fabrice Du Welz, Alléluia
John Logan, We Are Still Here


+ 1

Tom Six, The Human Centipede III (Final Sequence)


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think thin think fat






























No âmbito da exposição "Think Thin" de André Trindade, a decorrer no Atelier Concorde até 21 de Novembro, o artista organizou um evento com a participação especial de Filipe Felizardo, White Noise e Alien Terrestre.

O colectivo White Noise preparou o fanzine "think thin think fat" que é apresentado nesse dia e faz parte do corpo de trabalho que André Trindade tem organizado nesse formato.


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Please Suck My Blood: The Dark Loves of Christopher Lee




















O MOTELx, em colaboração com o colectivo White Noise, organiza uma homenagem ao grande ícone do cinema de terror, o britânico Christopher Lee, desaparecido em Junho passado aos 93 anos. Lee, imortalizado pela sua interpretação de Dracula nos filmes da Hammer, fazia parte da mesma estirpe de rostos clássicos do terror como Lon Chaney, Boris Karloff ou Bela Lugosi. Para este efeito, foi lançado o convite ao jornalista e crítico dos “Cahiers du Cinéma”, Stéphane du Mesnildot, autor de diversos livros sobre cinema de género como «Jess Franco. Énergies du fantasme», «Fantômes du cinéma japonais. Les métamorphoses de Sadako» e o mais recente «Le Miroir obscur. Une histoire du cinéma des vampires», todos editados pela Rouge Profond, para escolher e apresentar um dos seus filmes preferidos do actor, «Eugenie (Jess Franco, 1969), e conduzir uma palestra que tem o sugestivo título «Please suck my blood: The dark loves of Christopher Lee». Em complemento a esta sessão, Stéphane du Mesnildot programou também a curta-metragem de Bertrand Mandico «Notre Dame des Hormones» (2014).


Programa:

12.09 | 17h00, Cinema São Jorge, MOTELx
"Please Suck My Blood: The Dark Loves of Christopher Lee"
Palestra por Stéphane du Mesnildot
Entrada gratuita

13.09 | 19h15, Cinema São Jorge, MOTELx
"Eugenie" (Jess Franco, 1969)
"Notre Dame des Hormones" (Bertrand Mandico, 2014)
Sessão apresentada por Stéphane du Mesnildot


Este é o clipe de apresentação do evento:





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Uma vela para Deus e outra para o Diabo



























Muerte de un ciclista (Juan Antonio Bardem, 1955)




«(...) esse histórico Salida de la misa de doce del Pilar de Zaragoza tem grande significado por marcar indubitavelmente o nascimento da cinematografia espanhola e, para além disso, fazê-lo não pelas chegadas e partidas de comboios que marcam o inicio da produção de filmes em quase todo o mundo, mas fixando no celulóide um testemunho da sensibilidade nacional, a fé religiosa, e precisamente no templo justamente chamado Santuário da Raça.» (Carlos Fernández Cuenca. (1959). Promio, Jimeno y los primeros pasos del cine en España. Madrid: Filmoteca Nacional de España).


 Imagens do Cinema na Espanha Franquista


Não é certo que Salida de la misa de doce de la Iglesia del Pilar de Zaragoza (Eduardo Jimeno Correas, 1897) tenha sido o primeiro filme da cinematografia espanhola pois existem polémicas e acusações de que sectores ligados à ditadura franquista tenham manipulado a História e criado o mito por motivos ideológicos. Mesmo assim, se compararmos os cenários escolhidos para este filme e para Sortie des usines Lumière (Irmãos Lumière, 1895), obra fundadora da produção de cinema em França, respectivamente a igreja e a fábrica,  compreende-se a diferente relação hierárquica que é dada às práticas da religião e do trabalho em cada uma das sociedades, a primeira maioritariamente agrária e a segunda em amplo desenvolvimento industrial. No caso espanhol, desde cedo o cinema foi entendido como uma máquina poderosa capaz de invocar todos os males denunciados pelos poderes vigentes, não só pela proximidade entre corpos que a escuridão da sala favorecia, mas também pela mensagem emanada pela tela. Trata-se de uma perspectiva que acompanhou a difusão do cinema no país, que se reorganizou com a entrada do som nas salas e que a ditadura do General Francisco Franco traduziu num veículo censor que pudesse dominar a população ao longo de várias décadas, obrigando a submeter para análise, primeiro os guiões e depois o produto final e o material de promoção. Entre outras medidas, ainda antes da chegada de Franco ao poder, em 1921, foi ordenado que as salas de cinema madrilenas fossem divididas em três espaços: um para as senhoras, outro para os senhores e um terceiro, iluminado por uma luz vermelha, destinado a casais, não fosse o Diabo envenenar os espíritos e embaraçar os corpos. Em 1937, em plena Guerra Civil, de ambos os lados das trincheiras o cinema era visto como veículo de propaganda pelo que os Franquistas criaram a Junta Superior de Censura Cinematográfica, pouco tempo depois de os Republicanos terem implementado normas censoras nos territórios que dominavam. (continua aqui)



Contribuição para um conjunto de textos sobre fendas na censura cinematográfica, iniciativa coordenada por Sabrina D. Marques para a publicação online Wrong Wrong. Para além dos que estão mencionados no final do texto, um agradecimento especial a Paulo Soares, cuja ajuda foi preciosa no visionamento dos filmes.



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Les lèvres rouges






















Les lèvres rouges (Harry Kümel, 1971




Na cultura popular, o equivalente feminino do Conde Dracula é encontrado na Condessa húngara Elizabeth Báthory, acusada do assassinato em série de centenas de mulheres virgens, cujo sangue utilizava para beber e se banhar de modo a rejuvenescer o corpo, numa deriva em busca da beleza e da vida eterna. Walerian Borowczyk partiu  da vida de Báthory para compor o retrato que faz parte no terceiro segmento do filme Contes immoraux (1974). Pouco depois da sua prisão, Elizabeth Báthory acabaria por morrer, desconhecendo-se o paradeiro actual dos seus restos mortais, tendo a sua biografia alimentado a imaginação popular, que a equiparou a Vlad, o Empalador, o Príncipe da Valáquia (actual Roménia) que serviu de base ao escritor irlandês Bram Stoker na criação da figura de Dracula. Mesmo após uma fria recepção critica ao seu filme anterior, Monsieur Hawarden (1968), drama de época em que uma mulher se disfarça de homem para evitar ser perseguida pela morte do amante, o realizador belga Harry Kümel arranjou facilmente financiamento internacional para Les lèvres rouges (1971), actualização da figura de Elizabeth Báthory, como se não tivesse sido presa e a sua vida se tivesse prolongado ao longo dos séculos. A ideia era manter o tom do seu filme anterior, combinado com boas doses de sexo e sangue, respondendo aos ventos da época que indicavam uma maior cedência da censura no que diz respeito a imaginários polémicos.

Em torno de Delphine Seyrig, icónica actriz francesa de origem libanesa, memorável nos papéis que representou em L'année dernière à Marienbad (Alain Resnais, 1961), Muriel ou Le temps d'un retour (Alain Resnais, 1963) ou Jeanne Dielman, 23 Quai du Commerce, 1080 Bruxelles (Chantal Akerman, 1975), juntou-se um grupo de actores internacionais propostos pelas diferentes partes envolvidas no financiamento: o americano John Karlen, mais conhecido pela participação em séries televisivas, nomeadamente na brilhante Dark Shadows (Dan Curtis, 1966-1971), recentemente adaptada ao cinema por Tim Burton, e na popular Cagney & Lacey (Barbara Avedon, Barbara Corday; 1981-1988); a modelo e estrela erótica canadiana Danielle Ouimet; e a jovem actriz alemã Andrea Rau, até aí apenas com notoriedade no sector hardcore. Para a composição física das personagens de Delphine Seyrig e Andrea Rau, o realizador teve como modelo a vincada personalidade das actrizes  Marlene Dietrich e Louise Brooks. As filmagens decorreram entre o pôr do sol e a madrugada, maioritariamente entre a estância balnear de Ostend (exteriores) e o hotel Astoria de Bruxelas (interiores).

O argumento de Les lèvres rouges centra-se no encontro de Elizabeth Báthory (Delphine Seyrig) e da sua secretária e companheira Ilona (Andrea Rau) com um casal de recém-casados, Stefan e Valerie  (Danielle Ouimet e John Karlen), que devido a um problema na ligação de transportes, se vê retido numa estância balnear deserta, durante a época baixa, enquanto nas redondezas ocorrem sangrentos assassinatos de mulheres noticiados pela imprensa local. O mistério ronda ambos os casais: se, por um lado, vão sendo lançados sinais da ligação de Elizabeth Báthory aos assassinatos referidos, por outro, o homem pertencente ao segundo casal recusa-se a regressar e apresentar a nova companheira à “mãe”, aristocrata com ideias bem definidas sobre o conceito de classe social. Segundo o relato de Harry Kümel, o slogan utilizado no trailer americano do filme chamava a atenção para este elemento, bastante secundário mas eficaz como motor na engrenagem da violência: Se pensa que estas duas mulheres são ferozes (wild, no original), espere até conhecer a Mãe.  Do encontro entre as diferentes agendas dos elementos dos dois casais, emerge uma enorme brutalidade na violência que antes era sugerida levemente e logo mecanicamente controlada, conduzindo inevitavelmente à reorganização dos casais e, posteriormente, a um desfecho marcado pela morte. Algo que não surpreende pois a morte não é mais que o signo que acompanha Elizabeth Báthory na viagem pelo tempo.






















Les lèvres rouges (Harry Kümel, 1971)




Les lèvres rouges, no mercado internacional traduzido para Daughters of Darkness, é um filme a quatro cores. Nos primeiros planos de Elizabeth Báthory, a baixa intensidade da luz pouco mais revela que o preto das botas brilhantes e o vermelho do batom nos lábios. O branco juntar-se-á, completando o esquema de cores dominante no vestuário e acessórios de todos os elementos do grupo que, em sucessivas trocas, fixam combinações de carácter simbólico, culminando na cena em que Elizabeth consuma a aproximação a Valerie, em que ambas usam branco.  Não será irrelevante ter presente que este conjunto de cores representa o Império Germânico e que foi adoptado pelo Partido Nazi, reforçando a ideia de que estamos perante duros jogos de poder que visam a imposição e a tirania. Para a construção dos ambientes outra cor é chamada: o azul da água e do céu nocturno, que se remete para a tranquilidade e revela o carácter aristocrata também evoca a frieza e, por se tratar da cor mais fria entre as frias, é para escuridão infinita, a morte, que inevitavelmente aponta.

Na composição das cenas, importa também realçar a influência da pintura das escolas flamenga e italiana, cujo exemplo maior é o plano polémico da  morte de Stefan que lembra a obra Lamentações sobre o Cristo Morto (1490) do pintor Andrea Mantegna (1431-1506); a música de François de Roubaix que sugere algum do minimalismo do compositor flamengo Wim Mertens, célebre pelas bandas sonoras que escreveu para os filmes de Peter Greenaway; os jogos de geometria proporcionados pela arquitectura dos locais desertos; a performance encantatória de Delphine Seyrig (a quem o realizador permitiu que ajustasse os seus diálogos) que coloca o movimento do corpo ao mesmo nível do uso da palavra, deslizando serpentinamente até colocar Valerie sob a sua capa negra, antes de a noite chegar ao fim; e, finalmente, o atmosférico e onírico tom geral. O resultado é um nível de estilização invulgar na produção de cinema de terror da época que é (des)equilibrado pelos habituais códigos do género, em cenas comandadas pelo sadismo, o gore e o sexo.

Harry Kümel afirmou que não lhe interessava o realismo no cinema e, certamente, que a depurada sofisticação fantasista de Les lèvres rouges acompanha o seu pensamento, pelo que não deixamos de acompanhar com ironia a ligação posterior de Delphine Seyrig a Jeanne Dielman, 23 Quai du Commerce, 1080 Bruxelles. Numa das obras mais fascinantes da história do cinema, Chantal Akerman questiona a utilização no cinema desta proposta de ilusão do pensamento e dos sentidos do espectador, que  Kümel sugere e em que assenta a estrutura de Les lèvres rouges. Akerman funde as vanguardas americanas e europeias, das décadas de 1960 e 1970, que ambicionavam despertar no espectador a percepção das especificidades do cinema, desmontando as suas características ilusionistas: os meios normativos na organização da narrativa e da criação de significado (europeia); e as propriedades espaciais e temporais do filme enquanto medium (americana).


Versão revista do texto distribuído no âmbito do ciclo BELA LUGOSI ESTÁ MORTO!, programado por Carlos Alberto Carrilho para o colectivo White Noise.



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Vampir-Cuadecuc




























Vampir-Cuadecuc (Pere Portabella, 1970)




No contexto da produção de cinema espanhola, embora Jess Franco e Pere Portabella ocupem posições singulares e diametralmente opostas, há um dado importante que os une: a vontade de experimentar. No início da carreira, Pere Portabella teve como principal distinção o facto de ter sido produtor de Viridiana (1961) de Luis Buñuel. No entanto, hoje talvez seja mais conhecido pelos frequentadores de museus e galerias de arte do que pelos das salas de cinema, com uma cinematografia composta por poucos títulos e muitos deles de duração curta, sem grandes preocupações narrativas, reflectindo sobre o cinema e os seus modos de produção. Jess Franco realizou cerca de duzentos filmes, para os quais escreveu argumentos, compôs música e fez a produção, participando muitas vezes como actor. Os baixos orçamentos levaram-no a soluções engenhosas, numa obra que muitos consideram curiosidade camp, trash ou exploitation, e uma informada minoria procura conhecer detalhadamente, tornando-o num dos realizadores de maior culto no mundo. A sua ligação a Portugal é intensa, onde realizou alguns dos seus melhores filmes, durante a década de 1970, aliado a co-produtores nacionais. Aqui viveu, casada com um português e de ascendência lusa, a sua primeira grande musa, Soledad Miranda, morta num trágico acidente de automóvel, entre o Estoril e Lisboa. Um dos exemplos mais célebres desta ligação é Die Liebesbriefe einer portugiesischen Nonne (Cartas de Amor de Uma Freira Portuguesa, 1976), filme com uma forte componente erótica, ainda que tenha obtido autorização para ser rodado em monumentos religiosos (entre eles, o Mosteiro dos Jerónimos). Quando esta obra foi exibida em Portugal, na década de 1980, foi motivo de escândalo levantado pelo tablóide Tal & Qual, que lhe colou, indevidamente, o rótulo de pornográfico, levando os actores nacionais participantes (Herman José, Ana Zanatti e Victor de Sousa) a se demarcarem dela.

A censura espanhola do regime ditatorial do general Francisco Franco, obrigou Jess Franco a refugiar-se noutras paragens para continuar a actividade de cineasta, principalmente quando se tratavam de aproximações ao softcore ou ao hardcore - muitas vezes forçado pelos produtores e distribuidores que chegavam a fazer terríveis inserções hardcore, rodadas sem o seu conhecimento e com outros actores. A maior parte dos seus filmes seguia para o mercado internacional, em versões diferentes, dependendo da força da censura local, pelo que não é tarefa fácil entrar na sua obra, sendo aconselhável um mapa que permita assinalar as versões que mais se aproximam do seu plano de intenções. Os grandes cultores da sua obra encontram-se espalhados pelo mundo e procuram avidamente as diferentes versões, trocando informações valiosas e discutindo em grupos especializados, nas redes sociais. Por volta de 1969, Jess Franco lança-se numa adaptação fiel da obra Dracula (1897) de Bram Stoker, a ser rodada em Espanha, com financiamento e actores internacionais. Não gostava particularmente dos filmes produzidos pela Hammer, que considerava versões a cores dos filmes de monstros da Universal, mas foi lá roubar a sua maior estrela, Christopher Lee, para desempenhar o papel do conde vampiro, juntando-o a outras vedetas internacionais, Klaus Kinski e Herbert Lom, e a lendas do cinema de género europeu, Maria Rohm, Soledad Miranda, Paul Muller e Jack Taylor. Count Dracula (El Conde Drácula, 1969) não teria grande interesse dentro da produção de Jess Franco ou da filmografia de Christopher Lee - impossível de descolar das suas interpretações de Dracula, nos filmes de Terence Fisher - não fosse a fama que lhe deu o catalão Pere Portabella, quando foi autorizado a acompanhar as filmagens, daí resultando a notável obra Vampir-Cuadecuc (1970). O termo catalão “cuadecuc” pode ser traduzido como “cauda de verme” mas também pode referir-se à parte não exposta no final de um rolo de filme.

Considerar Cuadecuc um dos mais célebres making-off da história do cinema, muitos anos antes da vulgarização deste formato, é bastante redutor em termos formais. Portabella usa filme a preto e branco de alto contraste, para a criação de imagens expressionistas que revelam os bastidores, a definição dos ambientes, a criação artificial de nevoeiro e de teias de aranha, as pausas, as repetições ou os sorrisos dos actores para a câmara, ou seja, para exibir todo o aparato que está para além da tela de cinema, expor os códigos que definem o género do terror e, de um modo mais lato, explorar a linguagem do cinema. Na pista de som, os diálogos foram substituídos por silêncio ou música concreta da responsabilidade do seu colaborador habitual, Carles Santos. Unindo o som de instrumentos musicais a ruídos reconhecíveis do quotidiano, que interferem insolitamente com o conteúdo da imagem, cria situações perturbantes, como as cenas em que os actores falam e apenas se ouvem sons que parecem toques insistentes de alguém numa porta ou no soalho. Pontualmente, os operadores de câmara de Franco entram no plano de Portabella como se estivessem a intervir com precisão numa cirurgia, que mais não é, do que um filme de terror modelado com efeitos especiais de baixo orçamento. O mesmo procedimento utiliza na curta Play Black (1970), agora com a sua própria equipa a filmar a gravação de um coro para a banda sonora de um filme sobre Antoni Gaudí. No entanto, o que destaca o dispositivo de Cuadecuc de um mero making off é o facto de Portabella (re)filmar a encenação de Franco, como se lhe pertencesse, a partir de diferentes ângulos, não só vampirizando o trabalho de Franco, como juntando imagens de uma Espanha parada no tempo, com ruas desertas e prédios que se diriam desabitados, a contrastar com outras imagens ou sons em off que indiciam sinais de movimento, mudança ou progresso: uma filmagem a partir de um veículo em movimento rápido, um comboio que passa tão veloz que só retemos as linhas do design das carruagens ou os sons de um avião e do que parece ser um martelo pneumático a perfurar o chão. Em planos repetidos, do alto da varanda da sua casa senhorial, Dracula vigia atento todos os movimentos à sua volta.

No genérico inicial de Cuadecuc está assinalado: Este filme foi realizado durante a rodagem de Dracula de Jesus Franco, produzido pela Hammer Films. Não existe evidência real de que a produtora britânica estivesse envolvida na produção do filme de Franco, pelo que podemos recorrer a alguma especulação para contextualizar este facto. E se não se tratasse de um lapso? E se esse erro factual fosse inserido, conscientemente, por Portabella, no genérico? Assim, também poderíamos imaginar que, nas condições em que está assinalado, o filme em questão nunca existiu, servindo apenas como motivo para contornar a censura e filmar abertamente a realidade crua da ditadura fascista espanhola. E que interesse nutriria Portabella pelo facto de o mestre de cerimónias Jess, partilhar o mesmo apelido, Franco, com o ditador Francisco? Portabella continuaria a reflectir sobre o regime fascista em Umbracle, realizado no mesmo ano que Cuadecuc e também com Christopher Lee. Em Cuadecuc, Pere Portabella não mostra a morte de Dracula e pede a Cristopher Lee que retire todos os elementos da sua máscara para ler o excerto da obra de Bram Stoker, que descreve a morte da sua personagem, terminando com um close up do rosto do actor, imóvel por alguns segundos a olhar para a câmara, enquanto se ouve a voz de alguém que grita: corta. O negro invade o écran e percebemos que é o fim. Poucos anos depois, a 20 de Novembro de 1975, o general Francisco Franco morreria, acelerando a queda da ditadura, e Pere Portabella tornar-se-ia num participante activo da vida política espanhola.

Versão revista do texto distribuído no âmbito do ciclo BELA LUGOSI ESTÁ MORTO!, programado por Carlos Alberto Carrilho para o colectivo White Noise.



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Bela Lugosi está morto!





















Com programação de Carlos Alberto Carrilho para o colectivo White Noise e organização em conjunto com o estúdio dos artistas plásticos André Trindade e Filipa Cordeiro, está a decorrer o ciclo de cinema BELA LUGOSI ESTÁ MORTO! A mostra acontece entre os dias 6 e 15 de Julho, no espaço 22ATELIER, e é constituída pelos títulos Vampir-Cuadecuc (Pere Portabella, 1970), Blood for Dracula (Paul Morrissey, 1974), Les lèvres rouges (Harry Kümel, 1971) e Vampyros Lesbos (Jess Franco, 1970). Cada exibição será antecedida por uma curta-metragem de Peter Tscherkassky: L'arrivée (1997/1998), Outer Space (1999), Dream Work (2001) e Manufraktur (1985).

O colectivo White Noise, de constituição recente, propõe-se programar cinema, entre "o melhor, o mais demente e o mais escondido". Como aperitivo, apresentamos o clipe de divulgação deste evento.





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Antes de saudarmos oficialmente o novo ano, encerramos aquele que terminou com algumas notas sobre o que marcou e ajuda a definir esse conjunto oficial de dias, ainda que as palavras se possam referir a produção que poderá ir um pouco além desse limite temporal. Um dos nomes que seguimos insistentemente foi Walerian Borowczyk, pintor, escultor e cineasta polaco radicado em Paris, onde sedimentou uma carreira auspiciosa na animação, apadrinhado por Chris Marker, passou para a longa metragem em modo live action no meio das transgressões eróticas dos anos 60 e 70, chegando a capa da revista Cahiers du Cinema, e terminou a carreira em ambientes pornô-chique que quase destruíram a reputação que lhe restava. O pontapé de saída para a operação de reabilitação em curso foi a bem sucedida campanha de crowdfunding lançada pela Arrow Video - dinâmica companhia inglesa responsável por óptimas edições de clássicos de Mario Bava, Dario Argento, Brian De Palma e Tobe Hoper, entre outros - para restaurar uma das suas primeiras longas-metragens, Goto, l'île d'amour (1969), a tal que originou a capa da revista francesa. Numa caixa sumptuosa, Camera Obscura: The Walerian Borowczyk Collection, a Arrow juntou a esta obra algumas das suas animações mais notáveis, as longas Théâtre de Monsieur & Madame Kabal (1967), Blanche (1972), Contes immoraux (1974) e La bête (1975), um livro editado por Daniel Bird e Michael Brooke com novos ensaios, artigos históricos de Raymond Durgnat, Philip Strick, Patrice Leconte, David Thompson e Chris Newby, e uma colecção de contos do artista, entre muitos outros extras preciosos. Apesar de se tratar de uma edição limitada e numerada, seguiu-se a edição autônoma de algumas dessas longas metragens. Em paralelo, entre Maio e Junho, o ICA apresentou em Londres a exposição Walerian Borowczyk: The Listening Eye, reunindo trabalhos pouco conhecidos como os estudos preliminares de animações e esculturas sonoras em madeiras que remetem imediatamente para os cenários artesanais dos seus primeiros filmes, também por ele desenhados. A operação da Arrow arrasta-se para 2015, que em conjunto com a sua novíssima congénere americana lançará Docteur Jekyll et les femmes, um dos seus melhores filmes, realizado já na década de 80, ainda antes de se dedicar a um novo titulo da série erótica Emmanuelle e acentuar o período de desgraça.

Por Portugal, na Cinemateca Portuguesa aconteceram dois óptimos ciclos dedicados ao cinema de terror clássico e contemporâneo. Falamos de Kiyoshi Kurosawa - O Padrinho do Terror, com cinco filmes rodados entre Cure (1997) e Kairo (2001), para nos fazer esquecer o fracasso recente de Sebunsu kôdo (Seventh Code, 2013), de um dos realizadores asiáticos mais importantes da actualidade, com uma carreira que passa pelo cinema e pela televisão; e do ciclo Mario Bava, figura tutelar do cinema de género italiano, com uma vasta obra repartida por trabalhos de realização, director de fotografia, operador de câmara e desenho de luz e efeitos especiais, em que os corpos, os objectos e os espaços são marcados de forma definida, recortados por jogos contrastados de luz e saturados de cor. O site À Pala de Walsh dedicou o dossier Os Filhos de Bénard ao "pai" de muitos cinéfilos portugueses e ex-director da Cinemateca Portuguesa, João Bénard da Costa. Um dos pontos altos da iniciativa foi a tradução para onze línguas de um dos seus textos mais conhecidos, dedicado ao "filme de muitas vidas",  Johnny Guitar (Nicholas Ray, 1954). Vindo de fora, ainda que com contribuições importantes de portugueses, destacamos: Joseph Losey na publicação La Furia Umana (ainda de 2013); Jean-Claude Brisseau na Foco - Revista de Cinema; Kinuyo Tanaka e Kenji Mizoguchi na revista LUMIÈRE; The Essential Raymond Durgnat organizado por Henry K. Miller; Mise en Scène and Film Style: From Classical Hollywood to New Media Art, mesmo que a preço proibitivo, do crítico australiano Adrian Martin; Midi-Minuit Fantastique : Volume 1, encadernação luxuosa dos primeiros números da célebre revista francesa dedicada ao fantástico; uma nova edição da revista online Lola; e a reedição de clássicos de cinemas das margens, Nightmare USA: The Untold Story of the Exploitation Independents de Stephen Thrower e The Haunted World of Mario Bava de Troy Howarth. Actualmente, o ensaio audiovisual é um meio de divulgação e reflexão pertinente, tendo na dupla Adrian Martin e Cristina Álvarez López um dos seus maiores cultores. Deles retemos o belíssimo exemplar que dedicaram a Brian De Palma, [De Palma's] VISION, a partir dos cenários de fantasia e da ideia de visão presentes na obra do realizador.




















Under the Skin (Jonathan Glazer, 2013)



Scarlett Johansson é despida da sua pose de estrela e posta à solta, a percorrer numa van ambientes urbanos da Escócia, enquanto flerta com os transeuntes. Há actores e pessoas comuns que são "apanhadas" enquanto caminham para o emprego ou para o centro comercial mais próximo, pelo que é ténue a separação entre o real e o encenado, entre os dispositivos do documentário e da ficção.
Pode passar por sacrilégio, mas neste aspecto, podemos ver Under the Skin (Jonathan Glazer, 2013) a aproximar-se de um certo "realismo" de Stromboli (Roberto Rossellini, 1950), nomeadamente no reflexo do confronto da estrela Ingrid Bergman, longe da segurança de Hollywood e das passadeiras vermelhas, com o vulcão e as condições exigentes em que vive a comunidade "primitiva" da ilha. O argumento de Walter Campbell e Jonathan Glazer pega no romance de Michel Faber com o mesmo nome e limpa-o de grande parte dos detalhes, incluindo o motivo do interesse da caçadora nas presas, criando uma narrativa fragmentada com pontas soltas entregues à capacidade ou interesse na decifração por parte do espectador. A propósito de Under the Skin, nas entrevistas, Jonathan Glazer gosta de citar Stanley Kubrick e relegar Nicolas Roeg para segundo plano. E é Kubrick que vemos, na geometria dos primeiros planos. Ainda o pressentimos, de tempos a tempos, na gestão precisa da música e do silêncio e no notável regresso a essa estilizada sala negra em que Scarlett Johansson caminha pela superfície de um liquido pastoso enquanto as suas vitimas nele se afundam. Mas é do David Bowie de Nicolas Roeg, em The Man Who Fell to Earth (1976), que mais nos lembramos: o cabelo laranja do alien andrógino, descendente da figura de Ziggy Stardust, intoxicado pelo álcool e pelo "american way of life", como também Scarlett Johansson de casaco de pêlo felpudo se vai desintegrando no contacto com a humanidade. We’re trapped in our shells. Skin can be beautiful one moment and frightening the next, é o comentário de Nicolas Roeg a propósito de The Man Who Fell to Earth, que quase rima com o filme de Glazer. Mas é o que está para além da pele que desconcerta a personagem de Johansson, incapaz de processar a complexidade do que é humano e rapidamente a caçadora passa a presa, o que vai ditar a sua queda. Certo é que o acentuar da fragilidade da personagem de Johansson a leva a procurar refúgio no espaço desabitado do campo e das florestas, como se qualquer pedaço da natureza terrestre ainda fosse esse espaço original arredado da construção humana. É aí que um homem a tenta violar, descasca-lhe a carcaça protectora e a empurra para uma redenção pelo fogo. Mas é no perturbante plano final que a criatura se revela finalmente ameaçadora: sobe com o fumo ao céu, que inesperadamente a devolve envolta na neve, como a coisa indefinível que irá contaminar o olhar do espectador, o que poderia fazer raccord com um plano de Quatermass 2 (Val Guest, 1957), clássico da ficção científica e do terror britânico, em que um grupo de cientistas observa num écran uma imagem gráfica semelhante a flocos de neve que caem sobre a Terra, que não são mais que pequenos meteoritos que em contacto com os terrestres os transformam em zombies ao serviço de uma comunidade alienígena.
   

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Jonathan Glazer, Under the Skin
Abel Ferrara, Welcome to New York
Vítor Gonçalves, A Vida Invisível
Joaquim Pinto, E Agora? Lembra-me
James Gray, The Immigrant
Hong Sang-soo, Nugu-ui ttal-do anin Haewon (Nobody's Daughter Haewon)
David Cronenberg, Maps to the Stars
Hong Sang-soo, U ri Sunhi (Our Sunhi)
Bruno Dumont, Li'l Quinquin
Hayao Miyazaki, Kaze tachinu (The Wind Rises)
Albert Serra, Història de la meva mort
Rithy Panh, L'image manquante
James DeMonaco, The Purge: Anarchy
Jennifer Kent, The Babadook

+ 14
Actor: Gérard Depardieu, Welcome to New York (Abel Ferrara)
Actriz: Essie Davis, The Babadook (Jennifer Kent)
Realizador: John Carpenter (omnipresente, mesmo sem novos filmes)
Banda sonora: Mica Levi, Under The Skin (Jonathan Glazer)
Ensaio visual: Adrian Martin & Cristina Álvarez López, [De Palma's] VISION
Evento: Mario Bava na Cinemateca Portuguesa (8 ½ Festa do Cinema Italiano)
Televisão: Penny Dreadful (John Logan), 1ª Temporada
DVD: Coffret Jean Epstein, Potemkine Films
Blu-ray: Torso (Sergio Martino), The Ecstasy of Films
Dual Format Blu-ray/DVD: Camera Obscura: The Walerian Borowczyk Collection, Arrow Video
Lost & found: Let's Scare Jessica to Death (John D. Hancock, 1971)
A grande (des)ilusão: The Sacrament (Ti West)
O pior: A Field in England (Ben Wheatley)
O mais aguardado: In a Valley of Violence (Ti West)

+ + 14
Mica Levi, Under The Skin OST (Milan)
Actress, Ghettoville (Werk Discs)
Shinichi Atobe, Butterfly Effect (Demdike Stare)
The Bug, Angels & Devils (Ninja Tune)
Lana Del Rey, Ultraviolence (Interscope)
Lorenzo Senni, Superimpositions (Boomkat Editions)
Ariel Pink, Pom Pom (4AD)
Kassem Mosse, Workshop 19 (Workshop)
Aphex Twin, Syro (Warp)
Andy Stott, Faith In Strangers (Modern Love)
Mr. Mitch, Parallel Memories (Planet Mu)
Popcaan, Where We Come From (Mixpak)
Untold, Black Light Spiral (Hemlock Recordings)
Dean Blunt, Black Metal (Rough Trade)


Como complemento, ver lista do melhor terror de 2014 (aqui).



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