American Horror Story: Asylum

















American Horror Story : Asylum (Ryan Murphy, Brad Falchuk; 2012)



The world is a filthy place,
It's a filthy goddamn horror show.
There's so much pain, you know?
There's so much ...

Depois de uma campanha intensa de posters, teasers e trailers, acabou de estrear a segunda temporada de American Horror Story (Ryan Murphy, Brad Falchuk; 2011– ), que perdeu todas as personagens e a maior parte dos actores pois o plano dos criadores é que a história não tenha continuidade e mude com o fim da temporada. No ano passado acompanhámos a família Harmon, enquanto se instalava na sua nova casa em Los Angeles. O pai Ben (Dylan McDermott) traíra a mãe Vivien (Connie Britton) e a mudança de cidade apontava para o recomeço da relação. No entanto, não vão estar sozinhos pois a mansão que os acolhe, também conhecida por Murder House, é casa e prisão de vários antigos residentes que por ali morreram. Desde logo, uma velha criada (Frances Conroy) que, apenas para os olhos de Ben, mantém a beleza insinuante da juventude (Alexandra Breckenridge). E um casal de homens (Zachary Quinto e Teddy Sears), responsável pela actual decoração da casa, cujas traições amorosas terminaram em desgraça. Visita frequente e indesejada da casa é uma vizinha (Jessica Lange) que demonstra um grande interesse por tudo o que aí se passa e parece conhecer bem os segredos que a rodeiam. Tate (Evan Peters) é um rapaz perturbado que se torna paciente de Ben e se apaixona pela sua filha Violet (Taissa Farmiga). Entretanto, uma figura vestida de latex preto, que parece decalcada de O Fantasma (2000) de João Pedro Rodrigues, começa a circular pela casa. American Horror Story foi nomeada para os prémios mais prestigiados da indústria televisiva norte-americana. Ganhou poucos, mas houve uma categoria em que foi imbatível e com todo o mérito: a de melhor actriz secundária para Jessica Lange.

O criador Ryan Murphy - mais conhecido por Nip/Tuck (2003–2010) e Glee (2009– ) - não trabalha regularmente dentro do género de terror pelo que American Horror Story não poderia ser uma série convencional. Como ponto de partida toma a casa assombrada, tal como a conhecemos de filmes como The Amityville Horror (Stuart Rosenberg, 1979), House (Steve Miner, 1986) ou Poltergeist (Tobe Hooper, 1982). Pelo meio pisca o olho a Rosemary’s Baby (Roman Polanski, 1968). Há terror, sustos e gore, o quanto baste. Mas o que nos faz agarrar verdadeiramente ao ecrã é a solidão dos adolescentes. Por via dos seus pecados são condenados a permanecer eternamente jovens e a vampirizar a existência dos novos habitantes da casa. Apetece repetir as palavras que Tate dirige a Violet: The world is a filthy place, there's so much pain, you know? Na internet abundam os videoclipes alternativos feitos para sucessos da música popular, a partir das imagens de Tate e Violet. Que mais não fosse, a primeira temporada de American Horror Story prova que ainda é possível fazer comover e chorar com uma boa história de terror.



American Horror Story : Asylum (Ryan Murphy, Brad Falchuk; 2012)



Welcome to Briarcliff, assim se chama o primeiro episódio da presente temporada de American Horror Story, subintitulada de Asylum. Criado para tratar doentes de tuberculose, Briarcliff Manor foi adquirido pela Igreja Católica, em 1962, para ser transformado num asilo para criminosos com doenças mentais. A Irmã Jude (Jessica Lange) é colocada na direcção. Usa lingerie vermelha por baixo do hábito e gosta de punir os infractores com vergastadas no rabo. Entende que os distúrbios mentais são uma desculpa para o pecado e que cada doente é apenas vítima da sua luxúria. A sua colega de trabalho, a Irmã Mary Eunice (Lily Rabe), larga a pose austera depois de ser possuída por um demónio. O médico de serviço, o Dr. Arden (James Cromwell), é um presumível criminoso nazi. Nos doentes há um cardápio recheado com as "anormalidades" da época: uma lésbica (Sarah Paulson) cuja amante autoriza o seu internamento quando sujeita a chantagem; um James Dean copycat (Evan Peters), tal como o caracteriza a Irmã Jude, que, depois de exposto a pressões racistas, mata a mulher negra e culpa extraterrestres pelo sucedido; Bloody Face, um assassino de quem não se sabe a identidade pois usa a pele da cara das vítimas como máscara; Shelley the Nymphomaniac (Chloë Sevigny), considerada demente pelo marido depois de ter cometido adultério com um bando de marinheiros; uma rapariga (Lizzie Brocheré) que, depois de anos de abuso sexual por parte do pai, assassina toda a familia; a famosa Anne Frank (Franka Potente), que afinal não teria morrido num campo de concentração; e muito mais prometem os próximos episódios. Paralelamente, decorre uma história passada na actualidade, em que um casal, em lua de mel e num roteiro de fantasias sexuais pelos sítios mais assombrados da América, visita o asilo, agora em ruínas, e dá de caras com Bloody Face. Tudo isto é temperado com música pop da época e bandas sonoras de filmes de terror. Mesmo tendo em conta o vigor da produção televisiva, não é fácil juntar um naipe de actores tão bom como o de American Horror Story: Asylum. Quando chegar o anúncio dos prémios anuais, Jessica Lange reúne condições para arrasar novamente toda a concorrência. James Cromwell perfila-se como um bom candidato. Quanto a Evan Peters continua seguro a construir a carreira. Um dia vai ser grande.

Também American Horror Story: Asylum tem referências obvias a clássicos de terror. Freaks (Tod Browning, 1932), The Exorcist (William Friedkin, 1973), Halloween (John Carpenter, 1978) e Friday the 13th (Sean S. Cunningham, 1980) são apenas alguns dos exemplos onde os criadores foram procurar inspiração para acompanhar o espectador, entre a ciência e a religião, num percurso sinuoso pelos limites da (in)sanidade. Parece demasiada esquisitice para explorar convenientemente em doze episódios. A acção, viciosa e viciante, decorre de forma vertiginosa. Mas, tal como na primeira temporada, contamos que, no final, todas as peças encaixem serenamente no puzzle complexo e sedutor que Ryan Murphy e Brad Falchuk nos oferecem. //

Link para o renascimento da idade de ouro das séries televisivas

Twins of Evil













Twins of Evil (John Hough, 1971)



Enquanto a renovação da Hammer marca passo com The Woman in Black (James Watkins, 2012) e Wake Wood (David Keating, 2011), vale a pena olhar para Twins of Evil (As Servas de Drácula, 1971) de John Hough. Uma obra pouco conhecida, merecedora da maior atenção e que em Julho foi lançada em DVD e Blu-ray pela Synapse Films. Para além dos habituais extras - imagens, música e uma cena não incluída na versão final -, a edição inclui dois documentários. Em The Flesh and The Fury: X-Posing Twins of Evil, durante cerca de oitenta minutos, o filme é posicionado na história da Hammer e no contexto social em que foi produzido. Inclui entrevistas ao realizador Joe Dante e ao influente Tim Lucas, crítico e editor da revista Video Watchdog. The Props That Hammer Built: The Kinsey Collection é um curto documentário em que Wayne Kinsey mostra a sua colecção de adereços, assinalando a importância que os mesmos tiveram na afirmação da Hammer como a Casa do Terror.

Twins of Evil é o terceiro filme da Karnstein Trilogy, baseada na personagem Carmilla, criada em 1872 por Joseph Thomas Sheridan Le Fanu, para a novela com o mesmo nome. De Jean Rollin a Jess Franco, Carmilla foi uma grande fonte de inspiração na criação de vampiros do sexo feminino no cinema. Mas Twins of Evil não é uma adaptação directa da obra de Le Fanu pois a Mircalla Karnstein, reencarnada em Carmilla na novela, são concedidos apenas alguns minutos da trama. O destaque é dado às gémeas Maria (Mary Collinson) e Frieda (Madeleine Collinson), que, depois da morte dos pais, viajam de Veneza para Karnstein para serem adoptadas pelo tio Gustav Weil (Peter Cushing), líder de uma terrível irmandade responsável pela captura e morte de bruxas e de outros supostos seguidores do diabo. O conde de Karnstein (Damien Thomas), invocando o demo, ressuscita Mircalla (Katya Wyeth) e com a sua ajuda é transformado em vampiro. Uma das gémeas, Frieda, entediada com o isolamento que vive na aldeia, procura a companhia do conde, que a seduz e secretamente transforma em vampira.

One uses her beauty for love! One uses her lure for blood. Which is the virgin? Which is the vampire?

A Karnstein Trilogy é uma resposta dos estúdios Hammer ao esgotamento dos filmes protagonizados por Dracula e também à mudança de costumes no que diz respeito à utilização do sexo e da violência no panorama audiovisual da época. Desde o primeiro filme na Hammer e ao longo das sucessivas releituras, Dracula - interpretado por Christopher Lee - largara um certo ar romântico e acentuara a frieza e o sadismo. Em Dracula: Prince of Darkness (Terence Fisher, 1966), o conde não profere uma única palavra, bastando a sua figura aterradora. Scars of Dracula (Roy Ward Baker, 1970) marca o ponto mais alto na violência, até essa data. Mas os resultados críticos e de público tornavam-se desanimadores. A introdução de mulheres libidinosas e com orientações lésbicas foi a estratégia que o estúdio estabeleceu para revitalizar o género. Primeiro com The Vampire Lovers (Roy Ward Baker, 1970) e depois com Lust for a Vampire (Jimmy Sangster, 1971), ambos em torno da tentadora vampira Carmilla. No filme seguinte, Twins of Evil, a novidade recai no protagonismo entregue a duas irmãs gémeas, numa bela imagem do bem e do mal. Enquanto Maria aceita resignada a realidade que o tio lhe impõe, Frieda oferece a alma ao diabo e não se coíbe em condenar a irmã à morte. As irmãs Collinson chegam à Hammer depois de terem posado nuas para as páginas da Playboy, como Playmates do mês. Desenganem-se, desde logo, aqueles que procurarem Twins of Evil por este aspecto pois é muito comedido nas cenas de nudez (ou lésbicas), quando comparado com os outros dois filmes da série. A Hammer introduziu a nudez em The Vampire Lovers e, a partir daí, tornar-se-ia em algo vulgar nos filmes do estúdio. Algum pudor nas cenas de sexo também se perdera com o tempo, mas mantendo-se sempre dentro do socialmente aceitável e sob a vigia do British Board of Film Classification. Isto obrigava ao uso de subtilezas - algumas muito pouco subtis - que criam apontamentos camp, como no plano de Twins of Evil em que vemos a mão de Mircalla a agarrar-se a um candelabro quando, fora de campo, está deitada na cama com o conde. Na Karnstein Trilogy, há regras importantes da mitologia vampírica que assumem outras formas. Uma delas, a possibilidade de os vampiros caminharem sob a luz solar, provoca incerteza no espectador quanto à definição das personagens e alterações dramáticas significativas na relação dos vampiros com os mortais. Os dentes também aumentam de tamanho, acentuando a pose grotesca.

Em Twins of Evil, o papel do principal vampiro cabe a Damien Thomas e não a Christopher Lee, como habitualmente no estúdio. Por esta altura, Lee desempenhava o papel de Dracula para outras produtoras, como em Count Dracula (1970)  de Jess Franco. Na figura do seu grande rival continua o eterno Peter Cushing, embora o papel deste fuja à norma instituída pelos filmes em que interpreta Van Helsing. Gustav Weil é o grande opositor dos vampiros mas o seu fanatismo leva a que, numa perseguição implacável, condene à fogueira muitas mulheres, inocentemente, acusadas de bruxaria. Maria e Frieda são o verso e o reverso de uma mesma moeda. O bem e o mal. E, enquanto as outras personagens também podem ser colocadas apenas num desses campos, Weil encarna uma dualidade que interpela o espectador. Duas realidades que parecem inconciliáveis nas outras personagens, encontram nele corpo e alma para uma expressão perfeita. Peter Cushing, a quem tinha falecido recentemente a mulher de forma trágica, empresta à personagem um semblante severo que reforça a crueldade das suas acções e que o aproxima do assumido vilão do filme, o conde de Karnstein. É um grande papel da longa carreira de Cushing.

Se Twins of Evil assume uma vontade de renovação, também partilha toda a carga gótica que associamos ao estúdio. Continuam as passagens oníricas pela floresta mas alguns cenários são ainda mais negros que o habitual. No castelo do conde há caveiras incrustadas nas paredes e estátuas com chifres. O realizador John Hough, no que diz respeito ao trabalho na Hammer, não tem a fama de Terence Fisher ou Roy Ward Baker. Ficaria mais popular pela direcção de The Legend of Hell House (1973). Mas merece o devido reconhecimento. Twins of Evil é o último grande filme de vampiros da Hammer e um dos melhores da sua história. Quanto a Dracula, antes do falso toque de finados do estúdio, ainda teria tempo para três excentricidades. Dracula A.D. 1972 (Alan Gibson, 1972) e The Satanic Rites of Dracula (Alan Gibson, 1973) representam duas aventuras na swinging London. The Legend of the 7 Golden Vampires (Roy Ward Baker, Cheh Chang, 1974) é o casamento improvável da Hammer com a mítica Shaw Brothers, numa mistura, invulgar para a época, de terror e artes marciais. //